quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Religião, religio e religare


O problema principal em relação às religiões consiste na necessidade da compreensão do fato que instituição religiosa nada tem a ver com um autêntico relacionamento com Deus.
O homem pensa, julga, supõe, cria, imagina e concebe. Para tal se utiliza do intelecto que é seu entendimento aliado ao seu raciocínio e juízo crítico. Naturalmente se esforça por elevar seu nível de compreensão e de avaliação de tudo o que o cerca e por isso medita e procura concluir. Porém, a angústia de muitos que morrem imersos nas dúvidas quanto a quem somos e de onde viemos revela onde a lamentável lacuna deixou de ser preenchida: na inerente natureza espiritual do homem, na sua indissociável relação com o sobrenatural. 
O homem é um ser espiritual por natureza, e assim sendo, não pode jamais se satisfazer, interior e plenamente, com as limitações impostas pelo que é físico e temporal. A mente humana pode medir, calcular, abstrair, avaliar e sentir. Mas o estado invisível da percepção, em última análise, transcende o físico e se enlaça ao invisível.
Sendo Deus Espírito, Sua natureza está acima do terreno do lógico e do fisicamente perceptível (embora possa manifestar-se de modo a mostrar-se tangível por qualquer um ou por todos os cinco sentidos). Mas desejando que o homem o busque em Sua natureza espiritual, concede ao ser humano o dom de crer, tendo este a finalidade de ser o meio pelo qual alguém pode compreender as coisas espirituais e conhecer o próprio Deus.
A fé não está subordinada à razão e tampouco é ela mesma irracional. Antes, a fé é um dom através do qual o homem compreende o incompreensível e discerne o que é humanamente indiscernível. E incompreensível e indiscernível, apenas e tão somente, se exclusivamente do intelecto natural desejar o homem depender. Eis aqui o porquê do fracasso da inquirição última do homem unicamente racional: a ausência de um coração que crê. 

O dom da fé não foi dado aos homens para suportarem o absurdo, mas antes para compreenderem o que é mais elevado, para penetrarem no que está deliberadamente oculto, e assim poderem aproximar-se de quem por eles deseja ser encontrado, a saber, Deus.
A fé não pode habitar juntamente com a rebelião, sendo esta última uma das causas da ausência de certeza e de segurança espirituais nos espíritos arrogantes.
E porque não podem e não conseguem compreender o que somente pela fé é compreensível, manifestam e evidenciam sua arrogância e rebeldia através do modo como se referem ao Autor da Sabedoria, generoso e pronto a conceder que creiam os que por isto anseiam. E para isto é aos homens concedida a oportunidade do arrependimento (que significa: mudança de posição, mudança de atitude ou mudança de direção).
Repetida e corriqueiramente ouve-se que religião vem de "religare" e que este religare significaria reatar o homem a Deus. Porém não é assim.
O tal vocábulo religare nem sequer existe nos melhores dicionários de Latim, e mesmo se existisse não foi esta a palavra usada pelos tradutores das Escrituras quando se depararam com o vocábulo original que se refere a um comportamento de respeito, amor e devoção a Deus.
A palavra em português é religião, porém é derivada da palavra utilizada na Vulgata Latina: Religio e na tradução alemã de Martin Luther (Lutero) é Gottesdienst que pode ser traduzida para: serviço a Deus. Portanto, Religio ou Gottesdienst (ambas traduzidas do vocábulo grego: qrhskeiav (aqui transliterado do grego) significam um posicionamento de relação e de serviço voluntário a Deus, o que se dá através do dom da fé.
Portanto Religião não significa religar, mas significa, como já dito: Serviço a Deus. E esta palavra, religião, nunca jamais foi citada nas Escrituras significando sinônimo de salvação.

O equívoco em admitir que qualquer instituição religiosa traria uma suposta união do homem a Deus tem sido facilmente verificado na prática. Pois quantas e quantas instituições religiosas nada têm a ver com Deus?

E como vim eu, pessoalmente, a crer? Este dom veio através da leitura da Bíblia que nada tem de contraditória. Mas o próprio Deus a chama de Espada de Dois Gumes, pois sua compreensão resulta em salvação para os que crêem, e a sua incompreensão resulta em perdição, pois sem a fé é impossível unir-se a Deus.

Muitos no passado não criam, mas vieram a crer. Eu mesmo não compreendia a Bíblia, mas hoje a compreendo, e isto por modo sobrenatural divino, discernindo espiritualmente pelo dom que, por Deus, me foi concedido gratuitamente. De modo que o racional se mostra sujeito ao que lhe é superior: o espiritual. E o espiritual possui autoridade para intervir e modificar o natural. Deus é Senhor sobre toda a Sua criação, sobre a natural e sobre a espiritual. 
E talvez alguém indague: mas ele não possui uma religião? No sentido bíblico (qrhskeiav) (cf. Tiago 1:27), sim. E este comportamento: Religio ou Gottesdienst só é possível através de um coração que crê. E eis aqui o fundamento do que creio: As palavras do Senhor Jesus Cristo a quem eu amo.

"Interrogado pelos fariseus sobre quando viria o reino de Deus, Jesus lhes respondeu: Não vem o reino de Deus com visível aparência. Nem dirão: Ei-lo aqui! Ou: Lá está! porque o reino de Deus está dentro em vós."  (Lucas 17: 20-21).